11/12/2017
Por Maiara Paula Scopel Advogada da área de Direito de Família e Sucessões
A corregedoria do Conselho Nacional de Justiça publicou o Provimento nº 63 de 14/11/2017, que disciplinou, dentre outros assuntos, a possibilidade de reconhecimento de maternidade e paternidade socioafetiva diretamente no Cartório de Registro Civil, sendo que anteriormente essa possibilidade era restrita à via judicial ou a alguns estados brasileiros que adotaram normas acerca da matéria. A mudança está provocando relevantes debates jurídicos, igualmente, pode-se afirmar que o Provimento trouxe avanços e surge em harmonia com as mais recentes decisões dos Tribunais superiores a respeito do Direito de família. Este Provimento atende um pedido de providências encaminhado pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família ao CNJ em 2015. O Supremo Tribunal Federal reconheceu o fato de que a paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios (RE n. 898.060/SC). Nada mais esperado e cabível do que a regulamentação do direito reconhecido pela Corte através da via extrajudicial, facilitando o reconhecimento da filiação socioafetiva. Dentre as premissas basilares da regulamentação, estão a necessidade de uniformização de procedimento entre todos os Estados brasileiros, visando dar maior segurança jurídica à paternidade e à maternidade socioafetiva estabelecida; a ampla aceitação doutrinária e jurisprudencial a respeito do tema, contemplando os princípios da afetividade e da dignidade da pessoa humana; a possibilidade de reconhecimento de vínculo biológico e afetivo simultâneo e o princípio da igualdade jurídica e de filiação. Neste sentido, poderá ser apresentado requerimento de reconhecimento de paternidade ou maternidade socioafetiva os maiores de 18 anos de idade, independentemente do estado civil, desde que o pai ou mãe socioafetivo seja ao menos 16 anos mais velho que o filho a ser reconhecido. Serão exigidos e conferidos minuciosamente os documentos de identificação do requerente e certidão de nascimento do filho, ambos em original e cópia apresentados ao registrador. Se o filho for maior de 12 anos será necessário o seu consentimento. Da mesma forma, serão colhidas as assinaturas do pai ou da mãe do reconhecido, caso este seja menor. Importante mencionar que o reconhecimento da filiação afetiva é irrevogável e somente poderá ser desconstituído pela via judicial, fazendo prova de eventual vício de vontade, fraude ou simulação. Em uma primeira impressão, saltou aos olhos a possibilidade de fraude ao instituto da adoção, todavia, com a clara intenção de impossibilitar a prática de atos fraudulentos e de má-fé, o art. 12 do Provimento prevê que caso o registrador suspeite de fraude, falsidade, má-fé, vício de vontade, simulação ou dúvida sobre a configuração do estado de posse do filho, encaminhará a recusa fundamentada do registro ao juiz competente para as providências legais. Para os casos onde já exista discussão judicial em curso a respeito de reconhecimento de paternidade ou de procedimento de adoção, não poderá o requerente utilizar-se do procedimento previsto neste Provimento. E, mesmo para os casos em que o reconhecimento espontâneo da paternidade ou maternidade socioafetiva seja realizado no Cartório, poderá ser ajuizada ação judicial para a busca da verdade biológica. Certamente com a publicação do Provimento e a sua aplicação prática no dia a dia dos Cartórios de Registro civil das Pessoas Naturais surgirão dúvidas e demandas judiciais discutindo a matéria, considerando ainda os efeitos patrimoniais e sucessórios consequentes do reconhecimento do estado de filiação. Por fim, no contexto geral a publicação do Provimento deve ser comemorada, porque permite trazer à esfera extrajudicial a resolução do problema, tornando mais simples e efetivo o direito das famílias socioafetivas.